Introdução
Iemanjá é uma das divindades mais veneradas nas religiões de matriz africana, sendo reconhecida como a senhora dos mares e a grande mãe de muitos orixás. Enquanto imagem arquetipica, dentro da psicologia analítica, pode ser compreendido através da figura da Grande Mãe, um dos principais padrões simbólicos do inconsciente coletivo. Neste artigo, exploraremos como a imagem de Iemanjá se manifesta no imaginário coletivo e qual a sua relevância simbólica dentro da psicologia junguiana.
O Arquétipo da Grande Mãe
Os arquétipos são padrões universais presentes no inconsciente coletivo, que emergem nas culturas de diferentes formas simbólicas. O arquétipo da Grande Mãe representa a polaridade da maternidade: por um lado, a nutrição, proteção e fertilidade; por outro, a devoração, o perigo e o aspecto destrutivo da natureza materna.
Iemanjá personifica essa dualidade de maneira singular. No imaginário religioso, ela é tanto a mãe acolhedora que protege seus filhos quanto a senhora dos mares que pode levar aqueles que desafiam suas forças. Essa ambivalência é uma característica essencial do arquétipo materno, que pode ser encontrado em diversas culturas sob diferentes nomes, como Deméter na mitologia grega e Isis no Egito Antigo.
O Simbolismo da Água e o Inconsciente
A relação de Iemanjá com o mar é um elemento crucial para compreendermos seu papel dentro do inconsciente coletivo. A água simboliza o inconsciente, o mundo das emoções e dos processos internos ocultos. O mar, em especial, representa as profundezas do inconsciente coletivo, um local de mistério, renovação e perigo.
Nesse sentido, Iemanjá é a guardiã dos mistérios do inconsciente. Aqueles que se conectam com ela frequentemente relatam experiências de cura emocional e de contato com suas próprias emoções reprimidas. Esse aspecto é similar ao da deusa hindu Kali, que representa a destruição e a renovação dentro do ciclo da vida.
Mitologia de Iemanjá
Originalmente, Iemanjá era associada aos rios e à fertilidade na região da atual Nigéria. Com a diáspora africana, seu culto se expandiu para as Américas, onde passou a ser venerada como a deusa dos mares. Na mitologia iorubá, ela é filha de Olokun, a divindade dos oceanos, e casou-se com Oduduá, com quem teve dez filhos, todos eles orixás que representam diferentes elementos da natureza.
Uma das lendas mais conhecidas relata que, ao fugir de um casamento indesejado, Iemanjá quebrou um pote mágico dado por sua mãe, Olokun, o que a transformou em um rio que fluiu em direção ao oceano, simbolizando sua transição das águas doces para as salgadas. No Brasil, Iemanjá é sincretizada com diversas figuras do catolicismo, como Nossa Senhora dos Navegantes e Nossa Senhora da Conceição. Suas festividades ocorrem em diferentes datas, sendo as mais destacadas o dia 2 de fevereiro, especialmente em Salvador, e o dia 31 de dezembro, quando devotos oferecem presentes ao mar em busca de bênçãos e proteção.
Iemanjá é frequentemente representada como uma mulher de grande beleza, com longos cabelos negros, emergindo das águas ou como uma sereia. Ela simboliza a maternidade, a fertilidade e a proteção, sendo considerada a padroeira dos pescadores e navegantes. Seus símbolos incluem o espelho, o pente e as conchas, e suas cores tradicionais são o azul e o branco.
Iemanjá e o Processo de Individuação
O processo de individuação refere-se à integração dos diversos aspectos da psique para atingir a totalidade do Si-mesmo. Iemanjá pode ser vista como um arquétipo orientador nesse processo, pois seu simbolismo remete ao confronto com as emoções profundas e com as relações primordiais, especialmente com o feminino e com a mãe interior.
Muitos rituais associados a Iemanjá envolvem a entrega de oferendas ao mar, o que pode ser interpretado como um ato simbólico de entrega ao inconsciente, permitindo que antigas feridas sejam lavadas e que um renascimento psíquico ocorra. Essa dimensão psicológica é essencial para compreender a relevância da divindade dentro do imaginário coletivo.
Conclusão
Iemanjá, enquanto arquétipo da Grande Mãe, representa tanto a proteção e o acolhimento quanto a força do inconsciente e a necessidade de enfrentar os próprios medos e emoções reprimidas. Sua relação com a água reforça seu papel de mediadora entre o consciente e o inconsciente, guiando os indivíduos no processo de individuação. Assim, compreender Iemanjá a partir da psicologia junguiana permite uma visão mais profunda de seu simbolismo e de sua influência na psique humana.